Após quatro derrotas em quatro jogos pela fase de grupos da Olimpíada, seleção feminina de basquete sofre sem renovação, fica sem legado e tem futuro incerto
Depois da derrota para a França por 74 a 64, as jogadoras e o técnico Antônio Carlos Barbosa buscaram explicações para tentar entender os motivos que levaram a seleção brasileira feminina de basquete à precoce eliminação na Olimpíada do Rio. Entre os principais fatores apontados estão a falta de experiência internacional de algumas atletas, um campeonato brasileiro com apenas seis times, renovação e o planejamento no ciclo olímpico. A última chance de deixar a Rio 2016 com pelo menos uma vitória será neste sábado, quando o Brasil se despede contra a Turquia, às 15h30 (de Brasília), na Arena da Juventude.
FALTA DE EXPERIÊNCIA INTERNACIONAL
– Com certeza, uma das coisas a serem melhoradas é jogar mais partidas de alto nível. Isso nos possibilitaria treinar mais para ter a prática de toda a preparação que fazemos fora de quadra – disse Iziane, ala e capitã da seleção brasileira.
Iziane, uma das referências da seleção brasileira, irá se aposentar após a Olimpíada (Foto: JAVIER SORIANO / AFP)
Com 10 das 12 jogadoras convocadas para a Olimpíada jogando no Brasil, as únicas oportunidades que as jogadoras têm de enfrentar as adversárias das outras 11 seleções na Rio 2016 são em torneios e amistosos internacionais. Mas a seleção brasileira chegou aos Jogos Olímpicos com pouca bagagem neste ano, realizando apenas três amistosos contra a França, dois contra o Japão, um diante da Sérvia e outro contra a China. Outro exemplo da falta de experiência internacional ficou claro na última edição do Mundial de 2014, na Turquia, quando algumas meninas sequer tinham passaporte.
- É um time irregular. É um time instável. Essa instabilidade, vou falar de novo e já virou até clichê: é falta de competição internacional, falta de jogo - definiu Barbosa.
- É um time irregular. É um time instável. Essa instabilidade, vou falar de novo e já virou até clichê: é falta de competição internacional, falta de jogo - definiu Barbosa.
TRABALHO IRREGULAR NA BASE
Embora o Brasil tenha atingido o auge há 22 anos, com o histórico título mundial, em 1994, na Austrália, coroando a geração de Hortência, Janeth e Magic Paula, não houve um legado. Sem o desenvolvimento na base e incentivo para o esporte, o processo de renovação não deu certo. A falta de campeonatos pelas categorias de base e o basquete sendo muito concentrado no eixo São Paulo e um pouco do Nordeste também prejudicou a descoberta e lapidação de talentos. No Mundial sub-19 da Lituânia, em 2011, Isabela Ramona terminou como cestinha, na frente de grandes nomes da modalidade como a americana Breanna Stewart que, hoje, bem trabalhada desde a escola, passando pela forte liga universitária dos Estados Unidos até a WNBA, se encontra em outro patamar e defende os Estados Unidos na Olimpíada.
Isabela Ramona foi destaque no Mundial sub-19 (Foto: Gaspar Nobrega/inovafoto)
Sem renovação, muitas das jogadoras que defenderam o país na Rio 2016 tem média de idade acima dos 30 anos. É o caso de Adrianinha (37), Kelly (36), Érika (34), Iziane (34) e Palmira (31). Adrianinha e Iziane, inclusive, já avisaram sobre a aposentadoria após os Jogos e fazem as suas últimas partidas na carreira no Rio.
- A gente nunca teve uma gestão muito profissional. Falo em termos profissionais. O voleibol está na situação em que está porque teve essa gestão. A liga de basquete masculino, que fez agora uma parceria com a feminina, tem uma gestão profissional, de gente competente que está focada no objetivo de levantar o basquete - destacou a ex-jogadora e comentarista do Time de Ouro da TV Globo, Hortência.
- A gente nunca teve uma gestão muito profissional. Falo em termos profissionais. O voleibol está na situação em que está porque teve essa gestão. A liga de basquete masculino, que fez agora uma parceria com a feminina, tem uma gestão profissional, de gente competente que está focada no objetivo de levantar o basquete - destacou a ex-jogadora e comentarista do Time de Ouro da TV Globo, Hortência.
No masculino há a Liga de Desenvolvimento de Basquete (LDB), que na última temporada contou com 24 equipes, de todo o Brasil, disputando uma competição para atletas da categoria sub-22
CAMPEONATO NACIONAL ESVAZIADO
Com apenas seis clubes, a Liga de Basquete Feminino (LBF) perde na comparação com as ligas de outros países que estão disputando a Olimpíada como Turquia, França e China. Além disso, os times estrangeiros, sobretudo os europeus, disputam uma série de competições continentais de alto nível.
Sampaio é o atual campeão da LBF e conta com quatro jogadoras da seleção brasileira (Foto: De Jesus / O Estado)
- As coisas precisam mudar nas competições nacionais. Precisamos de campeonatos mais fortes, com times mais fortes, para chegarmos em torneios de alto nível em condição de igualdade com seleções que fazem um intercâmbio grande. Nós temos a oportunidade de fazer isso só durante a Olimpíada ou no Mundial. O basquete feminino no Brasil tem muitas lutadoras guerreiras com pouco apoio. E a seleção brasileira é um pouco o reflexo disso. A gente vê seleções europeias com um intercâmbio grande, campeonatos fortíssimos, e no Brasil temos uma liga com apenas seis equipes e o basquete nem é desenvolvido no país inteiro - analisou Iziane.
A comparação com o NBB (campeonato brasileiro masculino) é desleal. O torneio masculino contou com 15 equipes disputando a edição 2015/2016, além de quatro lutando pelo acesso na Liga Ouro.
PLANEJAMENTO RUIM NO CICLO OLÍMPICO
As várias trocas de treinador no ciclo olímpico de Londres 2012 voltaram a acontecer nos quatro anos seguintes, na preparação para a Rio 2016. Luiz Cláudio Tarallo iniciou como treinador, mas foi substituído por Luiz Augusto Zanon, em 2013. O treinador seguiu até o fim de 2015, quando foi anunciado o retorno de Antônio Carlos Barbosa, que assumiu já no ano olímpico, em meio a um boicote dos três clubes da LBF com jogadoras na seleção que exigiram uma série de medidas para ceder as suas jogadoras para a seleção.
As mudanças de comando e a crise na relação entre clubes e seleção atrapalharam o planejamento para a Olimpíada. O próprio Antônio Carlos Barbosa, durante a preparação para os Jogos, falou em diversas oportunidades que gostaria de ter feito mais amistosos e até torneios preparatórios contra outras seleções de bom nível técnico, mas tudo que o Brasil conseguiu para o ano olímpico foram três amistosos com a França, dois com o Japão, um com a China e um com a Sérvia. Fora isso, as jogadoras ficaram três meses treinando para a Rio 2016 em Campinas, no interior paulista.
Barbosa reassumiu a seleção a poucos meses da Olimpíada (Foto: Divulgação CBB)
- A Joice, por exemplo, estava desde Londres 2012 sem jogar na seleção. Não houve sequência, não houve planejamento. Eu peguei a coisa no final. Tentei fazer o melhor, juntar o que tinha de melhor, com jogadoras experientes. Mas faltou jogar mais, para testar formações, deixar o time emocionalmente pronto - avaliou o técnico.
Nos últimos anos, a seleção feminina tem colecionado resultados ruins. O time conseguiu apenas uma vitória nas Olimpíadas de 2008 e 2012, sendo eliminado ainda na primeira fase em ambos os casos. Em Campeonatos Mundiais, a seleção também não conseguiu a vaga para as quartas de final nas edições de 2010 e 2014. Nos Jogos Pan-Americanos, a seleção ficou em quarto lugar em Toronto 2015 e conquistaram o bronze em Guadalajara 2011.
- Você vai somando os nossos erros no jogo e vê que o adversário não comete as mesmas falhas. Essa é a diferença. Você joga, tem volume de jogo, muda jogadoras, traça estratégia, mas falta algo a mais. Talvez uma sequência de amistosos, de mais jogos, ajudaria a arrumar isso - sugeriu o técnico Barbosa.
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